segunda-feira, 6 de outubro de 2014

Livros, supermercado e camarão à francesa ajudam Betão contra o desemprego


Betão já passou por muitas aventuras e experiências no futebol. Foi do céu ao inferno com o Corinthians, conquistou títulos e chorou compulsivamente na queda para a Série B. Na Europa, marcou Messi pelo Dínamo e foi à final da Copa da França com o pequeno Evian. Agora, aos 30 anos vive o outro lado da profissão. Está desempregado e curte o tempo com livros e uma nova paixão: a culinária.
Betão enfrenta a dura rotina de estar sem clube pela primeira vez em 20 anos de carreira depois de jogar pela Ponte Preta no ano passado. Ele admite a ansiedade, mas se adaptou bem à nova situação. Decidiu adotar hábitos rotineiros para as pessoas comuns, mas raros entre atletas badalados.
Nos últimos meses, ele curte a família, lê livros de história, se diverte em idas a supermercados e aprendeu a cozinhar. A comida virou um hobby ainda quando morava sozinho em Kiev e longe da família. Teve que se virar para aprender pratos simples e acabou pegando gosto pela coisa. Usou os amigos jogadores como 'cobaia' de seus experimentos e agora se tornou o 'chef de cozinha' da casa.
Entre os pratos de seu menu estão estrogonofe, macarronada, costela de porco, carne assada, churrasco e outros mais sofisticados como camarão à francesa. Ele ainda mostra que é prendado para fazer doces. Os filhos adoram o bolo de cenoura e a sobremesa 'delícia de abacaxi'.
"Eu penso no que estou com vontade de comer. Se estou com vontade de comer uma costela de porco assada, entro no site e vejo a receita. Vou fazendo de acordo com a minha cabeça, vou adaptando e invento na hora. Não tenho uma receita predileta, tenho uma cozinheira que vai em casa três vezes por semana, nos outros dias sou eu quem faço. Não sou excelente cozinheiro, mas o pessoal come com gosto."
E como um bom chef de cozinha Betão faz questão até de escolher os ingredientes que vai usar nas receitas. Vai com frequência ao supermercado e causa espanto aos torcedores que encontra.
"Sempre acontece de o pessoal ficar me olhando. Teve uma vez que estava no mercado escolhendo cebola e um rapaz ficou me olhando um tempão. Ele me olhou e perguntou 'você é o Betão?'. Ele não entendia como o Betão poderia estar escolhendo cebola. Eu falo para as pessoas que sou normal, também gosto de cebola. Também acontece de eu estar na fila do banco e as pessoas olharem e ficarem duvidando: "Betão, você paga conta também?". A gente paga conta, talvez até mais que vocês", brinca.
Além da culinária, Betão tem outros hábitos refinados como a leitura e o gosto pela história. Depois de morar na Europa e conhecer culturas de países como França e Ucrânia, o ex-corintiano se interessou pela história da Segunda Guerra Mundial e chegou a aprender seis idiomas. Hoje, se vira bem com o russo, francês, inglês, espanhol, italiano, além do português.
E é essa bagagem que ele adquiriu na Europa que quer contar em um livro sobre histórias de jogadores que se aventuraram pelo mundo. Além disso, ainda tem um projeto de lançar um portal com notícias, pensamentos e dicas que vão de viagens a gastronomia.
"A minha intenção é mostrar para as pessoas a vida na Europa de um jogador de futebol. As pessoas só pensam no glamour, imaginam que todo mundo é milionário e vai ganhar como Kaká, Robinho e Ronaldinho. A pessoa vai para lá e em muitas vezes vai para clubes pequenos e para um país em que ele não conhece a cultura, a moeda, a história, o idioma, fica totalmente perdida. Muitos querem voltar no primeiro dia. Eu queria mostrar um pouco esse lado. Coisas que eu vivi, escutei e que eu vi acontecer com outros jogadores".
Com tantos projetos, ele se considera um jogador que se difere da maior parte dos colegas de profissões. "Eu nunca tive o estereótipo de jogador, essa coisa de ostentação, correntona, brincão. Nunca fui de ficar envolvido nesse mundo de glamour, sempre fui simples na minha maneira de ser. Vou ao mercado, à farmácia, padaria. Me sinto diferente, sempre gostei de ler, escrever, aprender novas culturas. Mas hoje em dia você já encontra muitos jogadores assim, mais equilibrados, inteligentes e que sabem se posicionar. A gente vê caras como o Alex, o Paulo André e iniciativas como o Bom Senso".
Aos 30 anos, Betão está desempregado, mas ainda distante da aposentadoria. Ele até cogita ser comentarista esportivo depois de pendurar as chuteiras, mas por enquanto só pensa em voltar aos campos e jogar enquanto tiver saúde provavelmente por mais uns cinco anos.
Reprodução / Instagram
Neste ano, ele chegou a ter propostas para disputar o Campeonato Paulista por equipes do interior, mas achou que a mudança seria muito sacrificante para a sua família e também estava com esperanças de ter uma nova chance no futebol europeu. Mas as conversas com o Evian, clube que jogou na França, não avançaram e agora ele vai aguardar até a próxima janela de transferências.
Enquanto isso, vai controlando a ansiedade. "É difícil ficar em casa, a gente fica acostumado com concentração e treino o dia todo. Quando está jogando até reclama um pouco, mas quando não está, fica ocioso. Sinto a ansiedade de voltar logo, não consigo nem ver jogo porque dá vontade de estar lá e não posso".
Para não perder o ritmo, ele tem feito treinos físicos por conta própria. "Foi uma vivência de muitos anos no futebol, está tudo guardado na minha mente. Não vou esquecer assim. Mas ainda faço os treinos físicos, tenho um personal trainer. A gente nunca sabe quando vai ter a guerra e por isso precisa estar preparado a todo momento. Se alguém disser 'preciso de você amanhã', estou pronto".

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