DJALMA VASSÃO/GAZETA PRESS
Rusga milionária entre Itaipava e WTorre atinge o Allianz Parque
A Cervejaria Petrópolis pediu segredo de Justiça no processo de R$ 39,6 milhões que move contra a WTorre, mas a juíza Celina Dietrich indeferiu a solicitação, o que tornou público todos os contatos e conversas entre as partes. E mostra uma trama com direito a intensa troca de e-mails que gerou acusações de traição e má-fé por parte da marca dona da Itaipava e até surpreendente notificação da arquirrival Ambev.
A ESPN teve acesso a todo o teor do processo nesta quinta-feira, que possui até o momento 161 páginas de documentos, cópias de e-mails e memorandos. Nele, é possível acompanhar desde o início dos acordos entre a Itaipava e a Real Arenas, braço da WTorre que administra o estádio do Palmeiras.
E com a cervejaria pedindo que a 'traição premeditada" não fique impune.
O imbróglio
Ocorreu que, no dia 7 de julho de 2014, as pares celebraram um Memorando de Entendimento para definir as condições comerciais para a aquisição de uma cota de patrocínio com exclusividade no segmento de cerveja e chopp por parte da Cervejaria no Allianz Parque.
Dessa forma, a Itaipava passaria a ter direito de exploração da arena por meio de eventos esportivos, culturais e de entretenimentos, com liberdade para ações de publicidade e marketing, incluindo camarotes e espaços físicos presentes no estádio do Palmeiras.
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Memo dava comercialização exclusiva à Itaipava no Allianz
Para esse patrocínio, foi dado um valor de R$ 2,83 milhões, que seriam pagos a partir da inauguração da arena, com as condições de pagamento a serem estabelecidas quando fossem assinados os instrumentos definitivos. Ficou acordado, também, que a comercialização de produtos concorrentes da Itaipava teria uma limitação de no máximo 20% nos eventos abertos ao público.
No mesmo "Memo" ainda ficou acertado que os contratos definitivos teriam que ser assinados antes do primeiro evento público a ser realizado no Allianz, com esforços para que fossem assinados em no máximo 30 dias a partir da assinatura do mesmo Memorando.
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Trecho do Memorando assinado pelo Grupo Petrópolis e pela WTorre
A partir daí começou o imbróglio. A Itaipava acusa a WTorre de má-fé e traição, principalmente com relação à assinatura dos contratos definitivos e ao percentual de limitações acordados, sendo que dessa forma deveria ser pago uma multa contratual por perdas e danos.
No dia 24 de julho de 2014, ou a 13 dias do fim do prazo estabelecido, a Itaipava enviou e-mail à WTorre solicitando os valores dos contratos definitivos, para assim finalizar as minutas. Cinco dias depois, a construtora disse que ainda não possuía tais números e alegou impacto fiscal pela demora.
No dia 4 de agosto, mesmo sem os valores, o Grupo Petrópolis enviou as minutas de contrato, também por e-mail. Sem resposta, a Itaipava envia novo e-mail, no dia 13, solicitando um posicionamento, e teve como resposta que os contratos só seriam analisados depois, "pois existiam outras prioridades".
Em outubro e novembro, a Petrópolis enviou novos e-mails cobrando desesperadamente um posicionamento da WTorre das minutas enviadas 90 dias antes, recebendo como resposta o reconhecimento da construtora de que a responsabilidade era dela própria quanto ao atraso e o comprometimento de que os contratos seriam finalmente analisados.
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Em e-mail, WTorre se responsabiliza por imbróglio
A Itaipava aponta que não houve cooperação da dona da arena para que os contratos definitivos fossem assinados a tempo. E, assim, a WTorre quis mudar as condições definidas no Memorando, especialmente quanto ao limite de 20% estabelecido anteriormente. No dia 19 de novembro, data do primeiro evento aberto ao público, o contrato ainda não estava assinado, o que gerou os primeiros prejuízos ao Grupo Petrópolis.
Mesmo assim, em 17 de dezembro, a WTorre respondeu a e-mail da Itaipava reafirmando que não havia a necessidade de preocupação, reforçando ainda a validade do Memo: "há um documento que formaliza a negociação", relembra uma funcionária da construtora, em mensagem por correio eletrônico.
No dia 27 de janeiro de 2015, ainda sem a resolução do mérito e com várias promessas anteriores da WTorre de que tudo seria sanado, mais um entrevero, novamente por conta do limite máximo de 20% na venda de concorrentes estabelecido no Memo. Nessa altura, a empresa ressalta que já havia aberto mão dos valores a que teria direito no show do Paul McCartney, por exemplo.
Depois disso, a Itaipava alega que a construtora não entrou mais em contato com as novas minutas contratuais, o que resultou em uma notificação da Cervejaria, em 24 de julho, e uma resposta com contranotificação da Real Arenas, avisando que o Memo não tinha mais valor desde o dia 19 de novembro do ano anterior.
Para completar, a WTorre apontou que a culpa pela não assinatura dos contratos definitivos era do Grupo Petrópolis, que ainda seria devedor de R$ 1,8 milhões à construtora.
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Itaipava acusa WTorre de querer inverter o jogo
"Pasmem! A WTorre demorou três meses para o envio de uma minuta, não cumpriu o acordado no memorando de entendimentos e ainda tem a desfaçatez de afirmar que a culpa pela não assinatura é da Itaipava", diz a cervejaria no processo.
Diante de tais fatos apresentados pela Petrópolis, o grupo aponta que existia uma multa no dobro do valor do Memo original - ou R$ 5,66 milhões -, além de uma cláusula apontar que a parte prejudicada poderia requerer indenização por perdas e danos.
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Memo garantia multa à parte prejudicada
Prejuízos
A Itaipava, então, entende que não vinculou sua marca nos eventos do estádio e ainda perdeu por não comercializar os produtos. A cervejaria aponta que comercializou seus produtos no Allianz, por causa do Memo, entre novembro de 2014 e julho de 2015, mas apenas em jogos de futebol, onde não existia venda de produtos com álcool.
Tudo isso, segundo o Grupo Petrópolis, por conta do descumprimento do Memo por parte da WTorre, que não permitiu a venda de Itaipava em shows e outros eventos, onde seria permitida a comercialização de bebidas alcoolicas.
A cervejaria calcula então que, nos nove shows ocorridos no período, teria vendido cerca de 500 mil latas por evento, com um lucro de R$ 836 mil em cada. E calcula os lucros cessantes de acordo com a média mensal de vendas em eventos esportivos, com a previsão de vendas em shows e a perda de visibilidade da marca no Allianz Parque.
Diante desse cálculo, a Itaipava aponta que deixou de vender mais de 6 milhões de latas de cerveja - ou 6.054.400, para ser mais exato -, em valores que alcançariam R$ 12,65 milhões, já descontados os 20% estabelecidos no Memorando.
Para apresentar o prejuízo com a não divulgação da marca na arena, a Itaipava calcula um percentual com base em uma média de 1,5 milhão de pessoas que frequentam os eventos do Allianz durante o ano, mais a geração de mídia espontânea, o impacto, o selo de fornecedor oficial e exclusivo de cervejas no estádio, o lucro em datas exclusivas, na faixa dos R$ 2 milhões e considerando um valor total de R$ 14,15 milhões a serem pagos em patrocínios de equipamentos, a Itaipava alcança mais R$ 28,326 milhões de prejuízo.
Carta da Ambev
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Em carta, Ambev diz para Petrópolis parar de negociar com o Allianz
E não para por aí. O Grupo Petrópolis também diz, na ação, que foi surpreendido com um termo de ciência da Ambev, sua maior concorrente no mercado de cervejas, informando ser ela (Ambev) a titular dos direitos reais sobre a exclusividade no fornecimento e exposição de marcas no segmento de cervejas na Arena Allianz Parque.
"Um fato que, se comprovado, pode ser considerado mais uma situação de má-fé da WTorre, que teria vendido uma propriedade no Allianz Parque que sequer teria o direito de fazê-lo. Será que teve a audácia de vender um direito que não tinha, mesmo declarando expressamente no Memo?", questiona a Itaipava no processo.
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Trecho de contrato entre WTorre e Palmeiras
Resposta da WTorre
Em contato com a reportagem, a WTorre afirmou que não comenta seus processos que correm na Justiça. No entanto, uma fonte próxima à empresa afirmou, à ESPN que, "Como não houve assinatura de contrato nem pagamento de nenhum valor à WTorre, entendemos não haver nenhuma obrigação com a referida empresa".